O caminho que trilhamos em direção às soluções afirmativas dos direitos das pessoas com deficiência em São Paulo tem se alargado gradativamente, mas ainda não chega até as paisagens áridas e desprovidas de cor do cenário urbano.
A incorporação pelo Brasil, como emenda constitucional, da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, promulgada pela ONU, colocou em pauta a responsabilidade do Estado de garantir aos vinte e cinco milhões de brasileiros com deficiência direitos fundamentais à educação, à saúde, ao transporte, à livre circulação sem barreiras e, entre outros mais, a viver em suas casas com autonomia e independência.
Parte das afirmações dos direitos presentes na Convenção já tem respaldo legal e políticas públicas relativamente garantidas. No caso particular da acessibilidade, o Decreto Federal 5.296, de 2004, trouxe referências mais seguras para a implantação de diretrizes para a eliminação de barreiras arquitetônicas em concordância com as Normas Técnicas NBR 9050 da ABNT. As edificações públicas e de uso público, assim como os serviços prestados às pessoas com deficiência, estão condicionados a medidas de acessibilidade total. Bancos, hotéis, restaurantes, teatros e escolas não podem funcionar sem que haja acessibilidade.
A habitação, por outro lado, ainda não é concebida para atender as necessidades do morador com deficiência ou redução na mobilidade. Morar sempre se torna um “adaptar-se às condições”, não raro com reformas demoradas e custosas, cujo preço maior é o indivíduo não se reconhecer em sua própria casa. De fato, a indústria da construção civil ainda não adotou como princípio a acessibilidade nas matrizes dos projetos habitacionais, mesmo que a adote obrigatoriamente quando projeta novas edificações de uso público.
Proporcionar meios de livre circulação e condições de orientar-se para os moradores de um edifício ou de um conjunto de residências, já deve ser entendido não mais como uma concessão, mas como o atendimento de uma exigência de usabilidade e de respeito humano às pessoas que necessitam desses recursos para viverem da forma digna que todos desejam. Não vivemos mais um mundo onde uns merecem o respeito e outros a indiferença e a discriminação. Quem pensa desse modo, mesmo disfarçadamente, atrasa o país e prejudica a todos.
O Estado tem como função estabelecer as condições necessárias e suficientes para que a sociedade se desenvolva de maneira constante e harmoniosa. Por isso, sua ação deve interferir profundamente nas questões que acentuam as desigualdades e injustiças. A habitação acessível para todos é uma dessas urgências que exigem uma atitude verdadeiramente comprometida com a justiça social, uma ação exemplar, que estabeleça um novo parâmetro para se morar e construir no público e no privado.
Com o Decreto Estadual Nº 53.485/2008, que introduz o conceito do Desenho Universal em todas as construções das habitações de interesse social, projetou-se um novo horizonte para a acessibilidade. Essa medida indica um verdadeiro avanço em duas frentes da cidadania: contemplar as pessoas com deficiência na acessibilidade a qualquer unidade habitacional - não segregando as famílias a ocuparem, por exemplo, locais vulneráveis e com menos conforto – e reconhecendo a deficiência como uma condição, transitória ou permanente, possível de se adquirir em qualquer momento da vida, sobretudo na velhice.
Novas tipologias habitacionais serão planejadas, com área maior e detalhes que surpreenderão os mais conservadores, mas ficará evidente cada vez mais quanto o modelo praticado é injusto e insustentável.
O horizonte a nossa frente exige que prefeitos e vereadores privilegiem a cidadania, revendo as legislações dos municípios para contemplar os novos parâmetros habitacionais. Será tarefa de todos assegurar que o direito de morar seja exercido com liberdade e segurança.
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