quinta-feira, 20 de março de 2014

DEFICIÊNCIA PSICOSSOCIAL - A Nova Categoria de Deficiência

Citação bibliográfica
SASSAKI, Romeu Kazumi. Deficiência psicossocial: a nova categoria de deficiência. Fortaleza: Agenda 2011 do Portador de Eficiência, 2010.

A deficiência psicossocial ― também chamada “deficiência psiquiátrica” ou “deficiência por saúde mental” ― foi incluída no rol de deficiências pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), adotada na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 13/12/06.
No Artigo 1 (Propósito), a Convenção afirma que “Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.” Trata-se de uma afirmação e não de uma definição. Se fosse uma definição, ela estaria no Artigo 2 (Definições).

De acordo com essa afirmação:

Se uma pessoa tem impedimentos...
Ela é uma pessoa...
... de natureza física
... com deficiência física
... de natureza mental (saúde mental)
... com deficiência psicossocial
... de natureza intelectual
... com deficiência intelectual
... de natureza sensorial (auditiva)
... com deficiência auditiva
... de natureza sensorial (visual)
... com deficiência visual

A inserção do tema “deficiência psicossocial” representa uma histórica vitória da luta de pessoas com deficiência psicossocial, familiares, amigos, usuários e trabalhadores da saúde mental, provedores de serviços de reabilitação física ou profissional, pesquisadores, ativistas do movimento de vida independente e demais pessoas em várias partes do mundo.
Convém salientar que o termo “pessoa com deficiência psicossocial” não é o mesmo que “pessoa com transtorno mental”. Trata-se, isto sim, de “pessoa com sequela de transtorno mental”, uma pessoa cujo quadro psiquiátrico já se estabilizou. Os transtornos mentais mais comuns são: mania, esquizofrenia, depressão, síndrome do pânico, transtorno obsessivo-compulsivo e paranóia. O Dr. João Navajas já dizia em 1997: “Se houver sequelas, essas pessoas poderão se adequar às limitações sem deixar suas atividades do dia a dia, como estudar ou trabalhar” (Sociedade Brasileira de Psiquiatria e Comunidade Terapêutica Dr. Bezerra de Menezes).
Também alunos com certos tipos de transtorno global do desenvolvimento (TGD) poderão, a partir de agora, fazer parte do segmento das pessoas com deficiência e beneficiar-se das medidas asseguradas na CDPD. Alguns desses tipos são: síndrome de Rett, síndrome de Asperger, psicose (http://lucimaramaia.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=15&Itemid=8) e autismo (“Autismo: inserção social é possível?”, Cinthia Pascueto, Jornal da UFRJ, ed. n. 200, 24/4/03). 
Em documentos a respeito da CDPD, a ONU usa o termo “deficiência psicossocial” ao comentar os impedimentos de natureza mental, ou seja, relativa à saúde mental. Um desses documentos produzidos pela ONU é o PowerPoint que explica o conteúdo da CDPD (Secretariado da ONU para a CDPD: www.un.org/disabilities).
O documento “The United Nations Convention on the Rights of Persons with Disabilities: Towards a Unified Field Theory of Disability”, de 22 páginas, ― que originalmente foi uma palestra ministrada em 10/10/09 pelo prof. Gerard Quinn ― é todo dedicado a traçar a trajetória de dois campos, o das deficiências e o da saúde mental, que se desenvolveram paralelamente no passado, mas que foram juntados em igualdade de condições no contexto da CDPD. Gerard Quinn é Diretor do Centro de Lei e Política da Deficiência, da Universidade Nacional da Irlanda (www.nuigalway.ie/cdlp).
Desta forma, pela primeira vez na história dos direitos humanos, pessoas do campo da saúde mental e pessoas do campo das deficiências trabalharam em torno do mesmo objetivo ― a elaboração da CDPD. Ao cabo de quatro anos, reconhecendo que a sequela de um transtorno mental constitui uma categoria de deficiência, elas a colocaram como deficiência psicossocial junto às tradicionais deficiências (física, intelectual, auditiva e visual).
Com a ratificação da CDPD por um crescente número de países-membros da ONU, estabelece-se uma ótima perspectiva para profundas mudanças nos procedimentos destes dois campos. Pois, mais de 40% dos países ainda não possuem políticas públicas para pessoas com deficiência psicossocial e mais de 30% dos países não possuem programas de saúde mental. Em todo o mundo, mais de 400 milhões de pessoas têm algum tipo de transtorno mental, conforme a Organização Mundial de Saúde. No Brasil, são 3 milhões de pessoas com transtornos mentais graves (esquizofrenia e transtorno bipolar), mas considerando os tipos menos severos (depressão, ansiedade e transtorno de ajustamento), cerca de 23 milhões de pessoas necessitam de algum tipo de atendimento em saúde mental. Acontece que em nosso país há somente 1.513 Centros de Atenção Psicossocial (Caps), segundo a Associação Brasileira de Psiquiatria (http://www.sissaude.com.br/sis/inicial.php?case=2& idnot=7154, 29/6/2010).
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Grupos de apoio: PcDP
O termo “pessoa com deficiência psicossocial” (PcDP) é relativamente novo, quase contemporâneo do nome anterior, “pessoa com deficiência psiquiátrica”. Mas, estas pessoas já se organizavam em grupos de autoajuda na década de 50, quando eram chamadas “ex-pacientes psiquiátricos”. Na década de 80, consideravam-se “sobreviventes da saúde mental” (ou “sobreviventes da psiquiatria”) e começaram a se chamar “deficientes psiquiátricos”.
De acordo com um estudo feito nos EUA em 1958 pela Joint Commission on Mental Illness and Health (JCMIH), já havia naquele ano mais de 70 organizações de “ex-pacientes psiquiátricos” em 26 estados, sendo 14 na Califórnia. A organização Recovery, Inc. tinha 250 pequenos grupos em 20 estados, totalizando 4.000 membros. Inicialmente, as pessoas se reuniam interessadas em relacionamentos sociais e troca de histórias de vida (“Action for Mental Health”, JCMIH, 1961, p.186-187).
As reuniões eram informais, coordenadas por uma pessoa com deficiência psicossocial ou por um consultor voluntário. O local era geralmente um hospital, clínica ou escritório de órgão público. Em 1989, 1991 e 1996, tive a oportunidade de participar dessas reuniões na Families and Friends Alliance for the Mentally Ill (Aliança de Famílias e Amigos de Pessoas com Transtorno Mental), um grupo que se reunia no Centro de Saúde Mental Acadiana, em Lafayette, Louisiana, EUA.
Hoje, as PcDP que lideram organizações e grupos de apoio são consideradas ativistas ou autodefensoras e lutam pelos seus direitos. Na Colômbia, o projeto “Reconhecimento da Capacidade Jurídica das Pessoas com Deficiências Intelectual e Psicossocial”, é executado pelas organizações Asdown e Fundamental Colombia, que reúnem pessoas com deficiência psicossocial (http://www.riadis.net/riadis-em-acao-15/inicia-se-execuccedilatildeo-e-seguimento-dos-micr/).
.Para saber mais:

Asoc. Cántabra para la Rehabilitación Psicosocial
www.acarp.org
Assoc. Bras. de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos
www.abrata.com.br
Assoc. Bras. de Síndrome de Tourette, Tiques e Transtorno Obsessivo Compulsivo
www.astoc.org.br
Assoc. dos Familiares, Amigos e Portadores dos Transtornos de Ansiedade
www.aporta.org.br
Assoc. Nacional Pró Saúde Mental (Projeto Fênix)
http://www.fenix.org.br/conteudo/material.htm

Rede Voz Pro Salud Mental 
http://portal.vozprosaludmental.org.mx
World Fellowship for Schizophrenia and Allied Disorders 
www.world-schizophrenia.org

ROMEU KAZUMI SASSAKI
Consultor de Inclusão Social
Email: romeukf@uol.com.br

terça-feira, 18 de março de 2014

Relatora quer privilegiar reabilitação em vez de aposentadoria

17/03/2014 - 11h37

A relatora do Estatuto da Pessoa com Deficiência, deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP), adianta outras mudanças que apresentará em seu substitutivo. Na questão previdenciária, por exemplo, ela pretende mudar o foco da aposentadoria por invalidez, para privilegiar as ações de reabilitação da pessoa com deficiência.

O objetivo, segundo ela, é estimular as pessoas a voltar ao mercado de trabalho. "A gente está colocando a reabilitação como dever do Estado, uma questão obrigatória. Hoje, alguns fornecem, mas a maioria não", afirma a deputada.

Ela também quer garantir mais autonomia aos deficientes mentais sob a responsabilidade de curadores. "Que essa curatela não tenha nenhuma ação restritiva, só protetiva, permitindo que essa pessoa tenha forma de exercer cidadania: se ela quiser casar, pode casar; se quiser tirar carta e passar no exame, ela pode dirigir; se ela quiser votar, pode votar; se quiser ser candidata e for votada, terá esse direito”, explica. “Hoje, para uma pessoa com deficiência intelectual casar, demora mais de ano para conseguir autorização de um juiz.”

Participação
O futuro Estatuto da Pessoa com Deficiência vem sendo construído por milhares de mãos. As sugestões que chegam à relatora têm os mais variados conteúdos: desde o técnico até o informal. A deputada vibra principalmente com as contribuições recebidas por meio do e-Democracia, canal de comunicação da Câmara com a população.

"Isso foi muito emocionante porque a gente tem quase 400 sugestões que vieram do e-Democracia”, diz Gabrilli. “Temos que transformar essas sugestões em um texto legislativo. E esse é um processo muito minucioso, no qual a gente deve ter cautela para que seja uma lei exequível, clara e não dê margem para a sua não execução. Esse é o maior cuidado que estamos tomando neste momento".

Novo Estatuto pode ser chamado "Lei Brasileira da Inclusão "

NOVA VERSÃO DO ESTATUTO TEM CONVENÇÃO DA ONU COMO PARÂMETRO
(imagem - foto colorida de dois cidadãos em suas cadeiras de rodas, ao alto, com uma grande escadaria à sua frente e abaixo, como representação das barreiras arquitetônicas existentes, inclusive em espaços públicos, e o direito à acessibilidade, fotografia da matéria de Valter Campanato - Abr)

A falta de consenso que tem impedido a aprovação do estatuto ao longo de 14 anos de tramitação na Câmara ainda não está totalmente superada. Porém, o fio condutor da nova lei já está claro. Trata-se da Convenção Internacional da ONU sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência. Ela foi assinada em Nova Iorque, em 2007, e confirmada pelo Congresso Nacional brasileiro em 2008 (Decreto Legislativo 186/08).
Logo em seu artigo primeiro, a convenção da ONU é contundente ao manifestar a intenção de "promover, proteger e assegurar o exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente".
Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho, Ricardo Tadeu da Fonseca ressalta a necessidade de reformulação de todas as propostas que estavam em tramitação no Congresso, a partir da convenção da ONU.
"Esse projeto tramita, de fato, há muitos anos, mas precisou de uma profunda reelaboração, tendo em vista a ratificação constitucional da convenção. O projeto estava obsoleto", afirma Fonseca.

Conferência nacional
Outra contribuição para o estatuto que será votado na Câmara vem da 3ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, realizada em 2012. A Secretaria Nacional de Direitos Humanos também elaborou uma minuta com sugestões para o estatuto, a partir da contribuição de juristas, representantes da sociedade civil e de parlamentares. O documento foi pessoalmente entregue ao Congresso pela ministra Maria do Rosário.
"O projeto de lei precisava ser melhorado e a Câmara e o Senado aceitaram trabalhar isso juntamente com o poder Executivo, o Ministério Público, juízes e a sociedade civil”, aponta o desembargador.

Mudança de nome
Entre as mudanças previstas no estatuto está até o nome que batizaria a lei. "Esse texto, na verdade, não é um estatuto, não é uma compilação da legislação da pessoa com deficiência. É praticamente um documento que vai regulamentar a convenção da ONU e fazer com que ela seja exequível e saia do papel", explica a relatora, deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP). "O nome que foi mais mencionado nas audiências públicas foi Lei Brasileira da Inclusão. Estou fazendo laboratório, testando as pessoas. E todo mundo tem uma boa reação quando ouve esse nome".

FONTE: Câmara

segunda-feira, 10 de março de 2014

Primeiros passos de um espaço escola! por Carlos Wagner Jota Guedes

Papo de Pai

“Papai, agora eu sou do primeiro ano, mas estou me sentindo como do segundo ano!” foi esta a frase que o João utilizou para dizer a novidade e a alegria de viver esta novidade que se apresentava em fevereiro de 2014. Acabou a educação infantil e começou o ensino fundamental. Ele se sente muito mais criança do que antes!!!!! Como diz a música do conjunto Palavra Cantada, feita para comemoração de aniversário, mas aqui utilizada muito além do aniversário:

“Hoje eu sinto que cresci bastante.

Hoje eu sinto que estou muito grande.

Sinto mesmo que sou um gigante.

Do tamanho de um elefante”.

João está agora em uma escola menor. Depois de ter passado pela experiência de uma escola com aproximadamente 2700 alunos, 18 alunos numa sala, estamos numa escola com no máximo 100 alunos, numa sala com 8 alunos. Junto a professora regente teremos agora uma acompanhante de vida escolar (grosso modo, é uma estagiária de pedagogia que irá fazer um acompanhamento mais detalhado e direcionado do cotidiano escolar para as necessidades educacionais especiais do João) e novos progressos são possíveis de se enxergar já no primeiro mês de aula. João está mais confiante, mais independente, até mesmo, mais atrevido. É impressionante observar como o João cresceu, desenvolveu, interage e fala. Quando olho para ele, me emociono de ver como aquele bebê se transformou em uma criança e que os debates e preocupações de antes se transformaram em outros. Se você retomar a leitura dos primeiros textos desta coluna, poderá observar que o debate era essencialmente sobre a necessidade de manter-se vivo, hoje e cada vez mais é fazer-se vivo e vivo em abundância.

Neste primeiro mês em escola nova fizemos o que nunca havíamos feito antes: levamos o João a uma festa de aniversário de um colega da escola. Embora ainda tenhamos muito para crescer neste contexto, foi uma vitória.

Neste primeiro mês também, o João chegou em casa todos os dias sujo, imundo, fedido e exausto. Tudo isso porque ele jogou bola, rolou no tanque de areia, fez atividades de escrita, “pintou e bordou”. Ele me conta sempre que defendeu bola (como o pai, decidiu estar goleiro), que bateu pênalti, que fulano, beltrano ou sicrano fizeram gols e/ou tomaram cartão. Conta que fez uma atividade que envolvia este ou aquele objetivo e que vai cuidar das plantas no projeto que sua turma está envolvida. O João que sempre conheceu todos nas escolas pelas quais passou, agora convive com todos. Essa é uma grande novidade para nós e a escola tem trabalhado de forma natural.

Ainda na primeira semana, diante da novidade que era a cadeira de rodas para os demais colegas, a professora debateu com a turma que a cadeira de rodas não era carrinho de brincar, portanto, não poderiam sair empurrando o João sem o consentimento dele e sem um adulto por perto. Daí surgiram novas perguntas, entre elas, porque o João não anda? Percebo que a pergunta foi bem discutida quando vejo que ao chegar à escola os colegas chamam o João para jogar bola, sem discutir se a cadeira atrapalha ou não, sem se preocupar se o João consegue ou não ter habilidades “perfeitas” para fazer um lançamento. Observo que o João está fazendo parte (fazer parte parece-me melhor que usar a palavra incluído) do cotidiano dos colegas em outras esferas da vida, que não seja estritamente o de estudante. É oportuno o nome da escola que o João estuda: Espaço Escola. Um espaço que ocupamos para aprender com, para viver com, para trocarmos com. Pedagogia essa que só tinha visto em livros e que hoje floresce em minha frente.

*Carlos Wagner é graduado em Ciências Sociais e mestre em Sociologia. É entre outras coisas pai do João. Assina a Coluna Papo de Pai, publicada toda quarta-feira em http://www.tudobemserdiferente.com

Lei de cotas deve passar por mudanças


Leone Farias 
Do Diário do Grande ABC

O Congresso Federal está finalizando a elaboração do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que deve trazer modificações na Lei de Cotas para deficientes no mercado de trabalho. Um dos focos é incentivar as pequenas empresas a terem, em seus quadros, profissionais com esse perfil, de forma a ampliar a inclusão no mercado de trabalho.

O projeto, que está sendo construído por grupo de trabalho formado por parlamentares junto com juristas e especialistas, aglutinou outras propostas de lei e também contou com críticas e sugestões ouvidas em audiências públicas pelo País. Discutiu-se, por exemplo, a possibilidade de que os micro e pequenos empreendimentos também fossem obrigados a cumprir a cota. Hoje existe a necessidade de reserva de 2% a 5% do quadro de colaboradores, mas apenas em empresas com mais de 99 funcionários. Porém, o texto do Estatuto não deve conter a exigência para companhias de pequeno porte, e sim estímulo fiscal para que estas adotem conceitos de acessibilidade em seus estabelecimentos. A ideia é facilitar para que os microempresários se sensibilizem a fazer admissões desse tipo.

Outra mudança sugerida no Congresso, mas que não deve ser incluída no texto do Estatuto, é a possibilidade de flexibilização das regras atuais, para que os empregadores tenham período de carência, prazo em que não precisariam preencher a cota. Hoje já é permitido que as companhias tenham mais tempo para se adequar, desde que façam TACs (Termos de Ajustamento de Conduta), em que se comprometem a cumprir gradualmente a regra, em período acertado com MPT (Ministério Público do Trabalho).

SUCESSO - A avaliação de especialistas é de que a lei de cotas, no formato atual, já representou grande avanço para a inclusão social, embora ainda haja milhões de deficientes fora do mercado. Até 2001 (quando o cumprimento das regras começou a ser fiscalizado pelo governo), havia em todo o País apenas 100 pessoas com esse perfil empregadas com registro em carteira. Hoje são mais de 320 mil. “É uma ferramenta importante e eficaz para as empresas abrirem as portas para pessoas com deficiência”, afirma Marcelo Vitoriano, gerente nacional de inclusão da Avape, entidade que atua na capacitação desse público e que já inseriu 23 mil trabalhadores com deficiência no mercado.

Vitoriano destaca que as companhias até precisam de tempo para se adequarem. “Mas todas que buscaram capacitar os profissionais e melhorar a acessibilidade tiveram sucesso nas contratações”, afirma. Ele avalia ainda que seria interessante ampliar as exigências para as micro e pequenas empresas, pois há casos de firmas com poucos funcionários, mas com faturamento alto.

Por sua vez, a presidente do Instituto Pró-Cidadania, Açucena Calixto Bonanato, também considera que houve mudança no cenário após a legislação, que existe há 22 anos, embora ressalte que muitas empresas ainda não cumprem as normas e que há poucas entidades especializadas na capacitação de deficientes fora dos grandes centros urbanos. Ela não veria problemas em flexibilização de prazos para o cumprimento da cota, desde que as companhias tivessem, em contrapartida, de realizar ações de inclusão, como investimentos em acessibilidade de ruas ou a produção de livros em braile.

Açucena acrescenta que o País ainda tem muito a avançar e que, hoje, as ações de capacitação dependem muito mais das entidades sociais, em parceria com a iniciativa privada, e não contam com verba pública. Isso apesar de o Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), do governo federal, estar qualificando pessoas com deficiência. “Ainda estamos engatinhando”, afirma a presidente do instituto.

Apesar de limitações, deficiente quer subir na carreira

Calebe Lopes, 22 anos, que mora em Santo André, trabalha há três em agência do Citi no município. Ele é assistente administrativo e sua função no banco é atender clientes, por telefone e pessoalmente, ajudando também a orientar em relação ao uso do caixa eletrônico, por exemplo, dentre outras atividades do dia a dia na instituição financeira.

Ele possui deficiência intelectual leve e tem conseguido desempenhar bem suas funções. “No começo era muito inseguro”, conta. Com o tempo, ganhou confiança. O apoio dos colegas de trabalho também ajudou. “Me dou muito bem com todos”, afirma Lopes. É uma troca, em que os que trabalham com ele também têm a ganhar, pela experiência da inclusão, diz a gerente geral da agência, Priscila Pessolato. E, apesar das limitações, Lopes terminou o supletivo e sonha em seguir na carreira bancária, fazer faculdade e crescer profissionalmente.

Ele é um dos 243 funcionários que fazem parte da cota de 5% de deficientes do Citi. O banco conta com mais de 1.000 funcionários em seu quadro, e está com índice de 4,8%. Apesar de abaixo do requisito legal, a instituição vem em processo gradual de crescimento do percentual, depois de ter assinado, há alguns anos, um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com o Ministério Público de Trabalho.

Adriano Bandini Tavares de Campos, especialista em diversidade do Citi, afirma que há a preocupação não só na quantidade, mas também em oferecer qualidade de trabalho, para reduzir o turnover (rotatividade). A empresa foca em diversos tipos de acessibilidade: arquitetônica, operacional, atitudinal (que envolve o treinamento da equipe para entender as limitações do deficiente), entre outras. Hoje há desde assistentes até analistas de produtos e gestores com deficiência no banco. “Quanto mais eles crescem, mais ficam conosco”, destaca.

Colégio tem projeto de inclusão

Calebe Lopes foi aluno no projeto Somar, parceria do Colégio Pauliceia, de São Paulo, com o banco Citi. O Somar existe há seis anos e tem como foco capacitar pessoas com deficiência intelectual (termo que se usa quando alguém apresenta certas limitações no funcionamento mental e no desempenho de tarefas como as de comunicação, cuidado pessoal e relacionamento social) para ingressar no mercado de trabalho.

O colégio é inclusivo desde 1978 e, além do trabalho com crianças, nos ensinos Infantil ao Médio, conta também com o PTI (Projeto de Trabalho Integrado), voltado a adultos. Essa iniciativa funciona em outra unidade do grupo e conta hoje com 60 participantes, de 16 até 50 anos. “Levamos essas pessoas a se desenvolver para o trabalho laboral”, diz a diretora, Carmen Lydia Trunci de Marco.

Carmen cita que, de forma geral, toda empresa tem atividades de baixa complexidade, de rotina, que podem ser desempenhadas por trabalhadores com deficiência intelectual.

E ela acrescenta que não são apenas essas pessoas que se beneficiam no processo de inserção no mercado. “A inclusão é fator de humanização dentro das empresas”, destaca. Nesse ponto, a diretora enfatiza a necessidade de acessibilidade atitudinal para que os outros funcionários estejam bem informados para conseguir os melhores resultados do profissional com deficiência.





quarta-feira, 5 de março de 2014

Nota Pública - Decreto de Regulamentação da Lei do Autismo

O Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência - Conade, reunido em sua 90ª reunião, considerando algumas noticias infundadas veiculadas antes da publicação da íntegra da minuta no site da SDH e outros veículos de comunicação, ainda a ser feito no dia de hoje, vem a público se pronunciar sobre o Decreto de Regulamentação da Lei do Autismo.

Cabe-nos informar, primeiramente, que nenhuma proposta extraída das discussões pode ser considerada uma surpresa para comunidade autista, haja vista a presença das duas entidades nacionais representativas do movimento ao longo de todo debate que gerou a proposta de decreto, bem como a consulta pública realizada por este colegiado.

No tocante a atenção à saúde das pessoas com espectro do autismo, e não portadoras de autismo como está sendo divulgado erroneamente e violando a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, não consta no texto do Decreto o encaminhamento dessas pessoas para os CAPS. Consta, sim, que ao Ministério da Saúde cabe:
I. promover a qualificação e articulação dos pontos de atenção da Rede SUS para atenção adequada das pessoas com transtorno do espectro do autismo, garantindo:
a) o cuidado integral no âmbito da atenção básica, especializada e hospitalar;
b) a ampliação e o fortalecimento dos cuidados em saúde bucal das pessoas com espectro do autismo na atenção básica, especializada e hospitalar;
c) a qualificação e o fortalecimento da rede de atenção psicossocial no atendimento das pessoas com o transtorno do espectro do autismo.
II. a ampliação e o fortalecimento, dentro da rede de cuidados de saúde da pessoa com deficiência, a oferta de serviços às pessoas com transtorno do espectro do autismo que incluam diagnóstico diferencial, estimulação precoce, habilitação/reabilitação e outros atendimentos necessários definidos pelo projeto terapêutico singular, de modo multidisciplinar;
III. garantir a disponibilidade dos medicamentos necessários para o tratamento de pessoas com transtorno do espectro do autismo;
IV. apoiar e promover processos de educação permanente e de qualificação técnica dos profissionais da Rede SUS;
V. apoiar pesquisas que visem o aprimoramento da atenção à saúde e a melhoria da qualidade de vida das pessoas com transtorno do espectro do autismo.

Fica claro, portanto, que a qualificação e o fortalecimento da rede de atenção psicossocial é elencada da mesma maneira que a necessidade de ampliação e fortalecimento dos cuidados em saúde bucal. O que se garantiu com o texto foi que o SUS em toda sua amplitude esteja disponível e preparado para o adequado atendimento às pessoas com transtorno do espectro do autismo, seja qual for sua demanda.

Ainda no âmbito dos necessários esclarecimentos, publicizar que as pessoas com transtorno do espectro do autismo ainda não contam com uma entidade nacional que as represente é no mínimo desrespeitoso com a entidade nacional que tem representação neste Conselho, a ABRA, bem como com a entidade nacional que igualmente participou e contribuiu com a construção do decreto, a ABRAÇA. Acreditamos que apenas através da participação social é que se torna possível a construção de políticas públicas de boa qualidade.

Certos de termos cumprido o relevante papel do controle social das políticas públicas que tenham relevância para as pessoas com deficiência e, após uma consulta pública que esteve disponível por mais de um mês e colheu contribuições de mais de uma centena de entidades, pessoas com o transtorno do espectro do autismo e seus familiares, o CONADE reitera seu compromisso em zelar pelos direitos das pessoas com deficiência à luz da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Pautados por esse compromisso, rebatemos os comentários pautados no preconceito e na discriminação que perpassaram as redes sociais no que tange às pessoas que fazem uso de álcool e outras drogas, bem como as pessoas com transtorno mental essas que, aliás, também têm seus direitos resguardados pela mesma Convenção que nos une.

FONTE: Conade, 21/02/2014

sábado, 1 de março de 2014

Análise da compatibilidade da deficiência com o cargo deve ser feita no estágio probatório


27.02.2014, Âmbito Jurídico

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou aos órgãos do Poder Judiciário que deixem de realizar exames prévios para saber se a deficiência física de candidatos em concursos públicos é ou não compatível com o exercício do cargo para o qual eles foram aprovados. A decisão foi tomada pela maioria dos conselheiros, durante o julgamento de dois pedidos de providências, na 183ª Sessão Ordinária do órgão, realizada na tarde de terça-feira (25/2), em Brasília. Prevaleceu o voto divergente, apresentado pelo conselheiro Rubens Curado. Na avaliação dele, a compatibilidade somente deve ser aferida no decorrer do estágio probatório – ou seja, após a posse do servidor selecionado.

A questão foi apreciada no julgamento dos Pedidos de Providência 0005325-97.2011.2.00.0000 e 0002785-76.2011.2.00.0000, movidos pela Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Mato Grosso do Sul e pelo Ministério Público Federal. Eles requeriam o afastamento da previsão de avaliação prévia da deficiência do candidato aprovado em concurso com as atribuições do cargo constante nos editais, assim como a uniformização de regras de concurso público para servidores do Judiciário, no sentido de que a compatibilidade da deficiência do candidato aprovado no certame fosse verificada exclusivamente durante o estágio probatório.

O conselheiro Emmanoel Campelo, relator dos procedimentos, votou pela improcedência por entender “não ser irregular nem ilegal o exame prévio de compatibilidade da deficiência declarada com o cargo ao qual concorre o candidato”.

Ao apresentar seu voto-vista, o conselheiro Curado esclareceu que não se discute a realização de perícia por comissão multidisciplinar para delimitar e determinar a existência e extensão da deficiência, até para o candidato ter a certeza se deve ou não concorrer às vagas reservadas às pessoas com deficiência. “O cerne da discussão é outro e diz respeito ao momento em que deve ser procedida a averiguação da compatibilidade entre a deficiência do candidato aprovado e as atribuições a serem por ele exercidas no cargo”, explicou.

Na avaliação de Curado, garantir à pessoa com deficiência o direito à avaliação da compatibilidade entre as atribuições do cargo e a sua deficiência durante o estágio probatório é a “solução que mais se coaduna com a integração social desejada pela sociedade democrática”, a teor do que dispõe a Constituição Federal e a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada pelo Brasil e com força de emenda constitucional . Curado também lembrou que a regra encontra-se descrita no artigo 43 do Decreto nº 3.298, de 20.12.1999, que dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. O próprio CNJ também adotou a regra na Resolução nº 75/2009, que trata dos concursos públicos para ingresso na magistratura. 

“São públicos e notórios casos de pessoas com deficiência detentoras de talentos excepcionais, a superar eventuais limitações físicas. São igualmente públicos e notórios pareceres prévios apressados, e por vezes injustos, acerca da ‘compatibilidade’ de tais deficiências com as atividades do cargo”, afirmou o conselheiro, em seu voto.

Curado destacou não vislumbrar uma única hipótese em que a mais grave das deficiências possa ser considerada incompatível com as atividades de um cargo de servidor do Judiciário. “Ao que me parece, toda e qualquer dificuldade teórica de compatibilidade pode ser superada no curso do estágio probatório, a depender do talento, da operosidade, das habilidades e das atitudes do candidato”. E ressaltou: “parece-me pouco democrático, quiçá discriminatório, diante do contexto normativo mencionado e do aludido dever de integração social, ceifar um candidato com deficiência, já aprovado nas provas de conhecimento, do direito de demonstrar, na prática do dia a dia do estágio probatório, não apenas a compatibilidade da deficiência com as atribuições do cargo, mas que detém talento, habilidades e atitudes suficientes para, eventualmente, suprir e superar a sua deficiência”.

FONTE?