Por ANDREI BASTOS
Os números do Censo 2010 do IBGE relativos às pessoas com deficiência
no Brasil foram questionados por alguns, e até já se fez a defesa
deles, como no artigo “Dados consistentes”, de Andrea Borges, publicado
no Globo. Se o percentual dessas pessoas é de 23,9% ou de 6,7%, eu não
me importo. Se a quantidade de deficientes incluídos na educação, no
mercado de trabalho e no lazer ainda é pequena, se o preconceito e a
discriminação em relação a eles ainda prevalecem e suas vagas de
estacionamento e prioridades de atendimento não são respeitadas, eu não
me importo.
Eu não me importo porque o respeito às vagas e prioridades de
atendimento, que já existe em boa medida, inevitavelmente resultará da
ocupação incansável pelas próprias pessoas com deficiência, e não por
interpostas pessoas, dos seus espaços na sociedade, que só há poucos
anos vivencia os novos paradigmas da inclusão. Mesmo os que ainda
consideram deficientes como coitadinhos já se ajustam à nova realidade
dessas pessoas circulando em todos os lugares, fora do confinamento de
instituições exclusivistas e segregadoras.
Não será duvidando de estatísticas que se promoverá a conscientização
da sociedade, das diferentes gerações, e até de nós mesmos. Somos todos
filhos do preconceito e da discriminação de quando os velhos, os
doentes e os deficientes eram abandonados para morrer, o que ainda
acontece nos rincões brasileiros e mundiais.
Se nós não tínhamos e, em muitos casos, ainda não temos nem direito à
vida, o que dizer do direito à educação, ao lazer e ao trabalho? Uma
coisa emenda na outra, e se a criança com deficiência não frequenta a
escola ou, mais tarde, um curso de qualificação profissional, como
exigir que na idade adulta lhe seja oferecido um emprego? Duvidando de
estatísticas ou trabalhando com honestidade e transparência por
políticas públicas de largo alcance?
Por menor que seja o percentual de pessoas com deficiência
brasileiras, o que importa é que seus direitos sejam respeitados e suas
necessidades específicas atendidas. Todos se beneficiarão com a boa
qualidade de vida resultante, e idosos, obesos, mulheres grávidas etc.
se juntarão ao percentual que seja de deficientes, estabelecendo
parâmetros amplos de inclusão, o que pode acontecer agora com a
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU,
ratificada como emenda constitucional no Brasil e sendo o foco da
Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência deste ano, e
políticas públicas nacionais.
Em sentido contrário, os guetos excludentes resultam de interesses
inconfessáveis e constituem um “nicho de mercado” que favorece a poucos,
particularmente a não deficientes, reduzindo perversamente o alcance de
uma inclusão ampla geral e irrestrita e preservando os bons rendimentos
eleitorais ou financeiros de políticos, instituições e pessoas que se
apresentam como defensoras de coitadinhos. Como deficiente nada
coitadinho, com isso eu me importo!
Andrei Bastos é jornalista e integra a Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ
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