sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Advogada mãe de autista pede apoio ao veto ao artigo 7º do PLS 168/2011, aprovado no Congresso

Em artigo de Deiva Lucia Canali, advogada no Paraná, mãe de pessoa com autismo, escrito em nome da Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas com Autismo - Abraça traz o seguinte relato:

"Operadores do direito estão habituados aos entraves ocasionados por textos legais mal elaborados. Uma frase dúbia, uma vírgula mal colocada, e lá se vão anos até que os tribunais superiores definam a interpretação correta do texto, o ‘espírito da lei’.

Quando da tramitação do Projeto de Lei 168/2011 já se chamou atenção dos legisladores para o problema representado pela redação do artigo 7º e seu parágrafo único, atualmente parágrafo segundo.

Trocando em miúdos, o artigo 7º diz que o gestor escolar não poderá recusar matrícula ao aluno com transtorno do espectro autista ou qualquer outro tipo de deficiência, sob pena de multa e, em caso de reincidência, perda do cargo.

O parágrafo do mesmo artigo, entretanto, diz que se o gestor escolar, quem quer que seja, entender que aquele aluno terá mais benefícios no ‘serviço educacional fora da rede regular de ensino’, poderá recusar a matrícula sem qualquer consequência.

Ora, se o resultado prático do parágrafo é anular as sanções impostas pelo caput do artigo, o artigo torna-se não somente inócuo como desnecessário. É o clássico ‘dá com uma mão e tira com a outra’…

Nem se discute a singeleza das sanções impostas – multa de 3 (três) a 20 (vinte) salários mínimos, o que por si só torna o artigo obsoleto. O mais grave, entretanto, é que o dispositivo altera a Lei 7853/89, art.8º., II, reduzindo de detenção e multa para esta irrisória multa a sanção a quem recusar matrícula a qualquer pessoa com deficiência (não só autista).

Na prática, o que ocorrerá é que os pais chegarão à escola com seu filho autista e o gestor, capacitado ou não, imediatamente ou após ‘longa análise’, poderá simplesmente dizer-lhes que seu filho será mais bem atendido em outro local, com mais condições, etc… etc… Os pais então baterão às portas de outra escola, e outra, e outra… até que não lhes reste alternativas.

Quando da discussão do assunto durante a tramitação, confrontados com a possibilidade de discriminação presente no projeto, alguns pais disseram ‘bom, aí é só acionar a justiça…’ – mas é justamente essa a questão: se os pais precisarem acionar a justiça cada vez que pretenderem efetivar a matrícula do filho autista não se faz necessário novo dispositivo legal, a Constituição Federal já os garante.

O que a nova lei deveria garantir é justamente que os pais não precisassem acionar a justiça para ver preservados os direitos de seus filhos. Além disso, o gestor escolar que recusar a matrícula, justificadamente ou não, se acionado judicialmente poderá sempre invocar o referido parágrafo em sua defesa, e estará ao abrigo da lei.

Ademais, a Convenção da ONU (CDPD), que tem equivalência de emenda constitucional, proíbe a discriminação e determina que os governos estabelecerão medidas efetivas, inclusive legislativas, para coibi-la, pelo que abrandar e anistiar a discriminação é ir contra a implementação da CDPD.

Não, não se trata de defesa incondicional da educação inclusiva, nos moldes em que posta hoje. Não se trata de estabelecer um paralelo ou um conflito entre a educação especial e a inclusiva. É óbvio que em alguns casos a educação especial é necessária e a inclusão não é possível, por conta das barreiras e da falta de suporte adequado no ambiente escolar.

Mas, como dito, não é disso que se trata. Trata-se de garantir a efetividade da lei que visa resguardar os direitos das pessoas com autismo. Trata-se de impedir que a lei que nasceu com a finalidade de garantir esses direitos venha, ela mesma, a institucionalizar a discriminação: a lei não pode delegar a terceiros – diretores, médicos, gestores – a possibilidade de negar acesso a direitos fundamentais, com base no autismo ou em qualquer condição de deficiência.

Apesar de toda a mobilização pela supressão, a questão não foi devidamente apreciada pelos legisladores e o parágrafo foi mantido. Esperamos agora que a Presidenta Dilma Rousseff dê ouvidos à razão e vete o artigo 7º do PLS168/2011, preservando os direitos constitucionais das pessoas com Autismo e outras deficiências."

Deiva Lucia Canali, OAB/PR 12.995, mãe de autista e membro da ABRAÇA

Assine e divulgue a petição PELO VETO PRESIDENCIAL AO ARTIGO 7º DO PLS 168/2011:
http://www.avaaz.org/po/petition/Veto_Presidencial_ao_Artigo_7o_do_PLS1682011/?cSLIMdb

Nenhum comentário:

Postar um comentário