quarta-feira, 25 de maio de 2011

Novo secretário promete diálogo aberto com o movimento das pessoas com deficiência

Antônio José Ferreira, que já estava à frente da SNPD interinamente, finalmente foi anunciado pela Ministra Maria do Rosário na semana passada, comprovando que nossos leitores são bem informados, já que seu nome apareceu mais de uma vez entre os comentários.

O novo secretário falou com exclusividade à Inclusive sobre sua trajetória, linha de trabalho e assuntos que vêm preocupando o movimento das pessoas com deficiência nos últimos tempos.

1) Gostaríamos que contasse um pouco sobre sua trajetória na luta pelos direitos das pessoas com deficiência.

Sou filho de uma família de camponeses muito pobres de São José do Egito, cidade do alto sertão pernambucano, a 420 kms do Recife.

Nasci com cegueira no olho direito, provocado por glaucoma congênito, perdendo com 6 anos a visão do olho esquerdo, por erro médico irreversível durante uma cirurgia.

Não tive acesso às políticas públicas em época própria, sendo que somente aos 12 anos pude frequentar escola e iniciar minha habilitação enquanto pessoa com deficiência. Para tanto, tive que escolher sair da casa de meus pais para estudar na capital, em uma escola de cegos.

Iniciei militância política aos 14 anos, quando fui eleito presidente do Grêmio Estudantil do Instituto de Cegos de Recife; passei pela diretoria da Associação Pernambucana de Cegos, onde fui presidente por 7 anos. Em seguida fui vice-presidente da extinta Federação Brasileira de Entidades de Cegos (FEBEC) e primeiro presidente da Organização Nacional de Cegos do Brasil (ONCB), entidade resultante da unificação do movimento dos cegos.

No período de 2000 a 2009, atuei no poder legislativo e executivo de Recife como: assessor parlamentar da presidência da câmara municipal, coordenador da política municipal da pessoa com deficiência, na secretaria de direitos humanos e segurança cidadã, e diretor da proteção especial da secretaria municipal da assistência social.

No ano passado, a convite do ministro da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), Paulo Vannuchi, exerci a coordenação geral de promoção dos direitos na Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNPD). Em 2011, fui designado Chefe de Gabinete e secretário substituto da SNPD/SDH/PR.

No dia 19 de maio de 2011 a Sra. Ministra Maria do Rosário, da SDH/PR, anunciou durante a reunião do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade) a minha designação como Secretário Nacional.

2) Quais serão as prioridades de sua gestão e como pretende conduzir o relacionamento com a sociedade civil e também com os ativistas que, nos últimos meses, estiveram muito apreensivos em relação à demora na indicação do titular da SNPD?

Pela minha própria história de vida, ressalto pleno interesse que nossas ações tenham diálogo aberto com todos os setores da sociedade e principalmente com as bases de nosso segmento.

É uma diretriz desta nova gestão da SDH que trabalhemos com os conselhos de direitos de forma ainda mais harmônica e com muita proximidade. O Conade tem sido e será um importante parceiro.

Temos a desafiadora tarefa de articular, nas esferas de governo, políticas públicas que atendam com eficácia as pessoas com deficiência. Atuaremos com projetos e medidas exitosas anteriormente empreendidos, bem como inovando em ações que possam fazer com que os serviços e programas do governo sejam um diferencial na vida das pessoas.

3) Na sua gestão, como se dará a participação da SNPD nas reuniões das comissões da pessoa com deficiência que recentemente estabeleceram-se no Congresso Nacional?

Acompanharemos os trabalhos do poder legislativo com profundo interesse sempre à disposição, encaminhando tudo que for de nossa competência em diálogo permanente.

4) A Secretaria vem acompanhando as discussões sobre a tramitação do PL do Estatuto da Pessoa com Deficiência e regulamentação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência? O senhor acredita na viabilidade de compatibilizar os dois instrumentos legais?

Sim, a SNPD vem participando das discussões e promovendo a difusão da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência para que qualquer alteração legal que exista, seja feita em consonância com seus preceitos.

Acredito que nossa legislação já tem muito do que prevê a Convenção e que agora que o Congresso Nacional e a sociedade civil têm debatido permanentemente esta questão, teremos excelentes resultados para que o direito seja implementado.

5) Os Projetos de Lei do Senador Ciro Nogueira, que altera a Lei 8.213, obrigando as empresas com cem ou mais empregados a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência, mesmo que na condição de aprendizes e o PL 112 do Senador José Sarney que estabelece em 3% as cotas para qualquer tipo de empresa, ferem a Convenção com restrição de direitos. O momento é apropriado para se fazer alteração da reserva de vagas nas empresas? Qual a atuação que pode esperar-se da SNPD a respeito de ambas matérias?

Como já mencionei, somos sempre pelo amplo diálogo, no entanto direito conquistado é direito conquistado e, enquanto governo, não hesitaremos em buscarmos medidas junto aos Ministérios, em especial ao do Trabalho e Emprego, para que as pessoas com deficiência acessem o mercado de trabalho, ocupando as vagas existentes.

6) Como o senhor avalia até o momento as contribuições à Consulta Pública ao Relatório de Monitoramento à Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência da ONU? O que a Secretaria planeja fazer com estas sugestões?

Esperávamos haver uma participação mais ativa da população, no entanto ainda há tempo para que as pessoas se manifestem e façam suas contribuições (até 7 de junho).

Vale destacar que no tema Convenção, a Inclusive tem sido uma grande impulsionadora de discussões, o que reconhecemos como de grande utilidade para o Brasil.

Temos a pretensão de logo que concluirmos todo processo junto a ONU, publicarmos o relatório para ampla divulgação.

7) A notícia de que os estádios onde se realizarão a Copa do Mundo não serão inteiramente acessíveis muito preocupa o segmento das pessoas com deficiência. O que a SNPD fará para fazer valer a legislação, garantindo que estas novas construções sejam realizadas de acordo com as normas da NBR 9050?

Estamos atentos às questões referentes a acessibilidade nos espaços em que ocorrerão as atividades da COPA/2014 e Olimpíadas e Paraolimpíadas/2016. Temos feito uma intensa interlocução no Comitê Gestor da Copa e diretamente nos Ministérios dos Esportes, Planejamento, Cidades, dentre outros. Contribuímos significativamente na formulação da norma de estádios e na revisão da NBR 9050 da ABNT, ainda por serem publicadas; como também temos acompanhado a atuação do Ministério Público Federal, fiscal da lei por natureza, nesta matéria.

8) Ainda sobre a Copa, a SNPD pretende se articular com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para a qualificação de pessoas com deficiência visando a atender a demanda de funções diretamente ligadas ao atendimento ao público no ramo da hotelaria e nos próprios eventos?

Reconheço que estamos um tanto atrasados nesta questão, pois até o momento não conseguimos fazer constar no organograma do MTE uma proposta de inclusão produtiva para as pessoas com deficiência, que atenda as reais necessidades do segmento com as garantias da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Acredito que no mais breve possível espaço de tempo, a SNPD, terá melhores notícias acerca desta temática para os amigos leitores da Inclusive.

9) Nos últimos meses, a política de educação inclusiva do MEC tem sido muito questionada a partir da notícia, depois desmentida, de que o IBC e o INES, no Rio de Janeiro seriam fechados. O movimento dos surdos e dos cegos reagiram duramente contra a suposta decisão e a comunidade surda usuária de Libras realizou recentemente em Brasília uma manifestação pela manutenção das escolas especiais para surdos. Ao mesmo tempo, a Federação Nacional das Apaes anunciou a realização de seminários, no âmbito dos municípios, para avaliar a política de educação inclusiva do MEC nas escolas públicas. Por outro lado, há um manifesto público recolhendo assinaturas pelo cumprimento do artigo 24 da Convenção que garante o direito à educação de todos os alunos em ambientes inclusivos. O que é possível esperar de ação mediadora da SNPD, diante deste cenário onde debatem-se interesses diversos e fragiliza-se um dos pilares da CPCD, que é o direito à educação?

Este é um grande debate que tem feito diversos setores do nosso segmento. Sou pessoalmente contrário à radicalização de qualquer tema, pois quando adotamos esta postura, passamos a ter dificuldades em ouvir as opiniões divergentes.

A educação inclusiva é uma extraordinária política de nosso governo, que a cada dia tem se consolidado; no entanto, sempre será uma política a ser construída e reconstruída.

O ministério da Educação tem feito um grande esforço na implementação de salas de recursos multifuncionais, capacitação de professores, disponibilização de cursos de formação de instrutores e intérpretes de Libras, para instrumentalizar a educação inclusiva, fundamental preceito da nossa Convenção. Nós da SNPD, temos ouvido todos os setores, buscando constantemente que os alunos com deficiência tenham a cada dia nos ambientes escolares equiparações de oportunidades.

Agradecimentos

Agradeço a equipe da Inclusive pela oportunidade de externar neste espaço nossos objetivos e opiniões sobre diversos temas.

Enquanto ex-militante da sociedade civil organizada, sou conhecedor dos enormes desafios que teremos que superar.

Estou plenamente consciente da responsabilidade que é gerir esta política nacional, que tem por principal objetivo melhorar a vida de milhões de brasileiros e brasileiras, das mais diversas localidades e regiões.

Assim, estou inteiramente à disposição deste veículo, acolhendo críticas e sugestões, pois nosso êxito nesta pasta será o êxito das pessoas com deficiência do Brasil.

Fonte – Inclusive

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